O Centro Hospitalar Universitário de São João (CHUSJ) contratou, através de um procedimento público internacional, um sistema de gestão de roupa hospitalar inovador e que, tenho a certeza, chamará a atenção os diferentes operadores que interagem nesta área.

Os problemas atuais na gestão de roupa hospitalar são por demais conhecidos pelos hospitais, fornecedores e têm reflexo na qualidade da prestação dos cuidados aos utentes dos hospitais, quer públicos quer privados. Evidentemente que a dimensão dos problemas atuais não é homogénea em cada instituição, mas todos reconhecerão que o serviço prestado nem sempre corresponde às expectativas dos gestores hospitalares, mas também dos prestadores de serviços de lavandaria. Hoje a grande maioria dos sistemas implementados assenta na faturação por quilo, num difícil senão impossível sistema de controlo do serviço e, independentemente de quem assume os custos acrescidos destes processos ineficientes, numa fatura global maior de todo o processo.

A gestão moderna dos processos quer-se transparente, com mecanismos de controlo de gestão eficazes, com informação válida e exata, o que resulta na facilidade do apuramento das responsabilidades de cada um dos operadores que atuam neste processo.

O novo processo contratado assenta num sistema de rastreabilidade têxtil que, como o próprio nome indicia, indica a localização da roupa hospitalar a cada momento. Esta funcionalidade, por simples que possa parecer, é potenciadora e geradora de informação muito relevante para a gestão de todo o processo. O gestor hoteleiro saberá permanentemente as existências em cada armazém: serviços, rouparia, lavandaria e ainda do exterior, admitindo que possam existir cedências de roupa por motivos sociais ou outros devidamente programados. Na interação com o prestador de serviços de lavandaria termina o referencial do “quilo” para a faturação, a percentagem de diferença entre o sujo e o limpo, sempre volátil e às vezes motivo de discordância das partes. Torna-se possível, com o novo sistema, a movimentação do stock por peça, no sujo e no limpo. Esta funcionalidade aporta, desde logo, uma informação muito relevante para o gestor do contrato (com responsabilidades acrescidas no âmbito do CCP) pois não existirão divergências entre o cliente e o prestador de serviços nas contagens de roupa de cama, do doente e do fardamento. Esta será, assim, a primeira grande novidade deste sistema: a geração de informação para o rigoroso e transparente controlo do contrato entre as partes.

O sistema de rastreabilidade têxtil traz uma segunda vantagem que me parece muito relevante: o facto de possibilitar quantificar a vida útil de cada peça têxtil. Por cada lavagem efetuada da peça têxtil, será contada uma lavagem e a consequente utilização, sendo assim possível chegar a “n” utilizações para cada peça têxtil. Esta informação é particularmente relevante para os serviços de aprovisionamento e o gestor hoteleiro, e assenta fundamentalmente em três ideias: a primeira assenta no facto de que, nos processos de aquisição de têxteis, com as respetivas caraterísticas técnicas (que são variáveis), o comprador poder determinar e auditar em operação o número de utilizações para o produto adquirido, conseguindo assim verificar na operação o contratado; a segunda, que se prende com um conceito que sempre defendi para as aquisições – o custo utilização em vez do fator preço por si só -, de facto, sendo fácil quantificar o número de utilizações de cada peça têxtil, é possível estabelecer critérios de adjudicação por custo/utilização menor e não somente por preço mais baixo; a terceira, não menos importante no contexto de uma unidade hospitalar, e uma vez conhecido o número de utilizações médio de cada peça têxtil, permite um planeamento das compras mais atempado e seguro, tendo em conta os consumos registados e o stock existente a um dado momento.

Ainda a propósito da monitorização e quantificação da vida útil de cada peça têxtil, embora seja um dado hipotético, é com elevado grau de probabilidade que podemos esperar o aumento significativo da vida útil das peças têxteis. De facto, ao serem controladas nos seus movimentos, quer para utentes ou profissionais, quer para os prestadores de serviços (lavandaria, serviços de transporte de doentes), a probabilidade da ocorrência de desvios por motivos de várias ordens é muito baixa, comparando com os sistemas de gestão de roupa atuais. Este expectável aumento da vida útil das peças têxteis gerará forçosamente menos necessidades de aprovisionamento de stocks, para um mesmo nível de consumo. Este facto induz, a prazo, um menor custo com aquisição de stocks de roupa de cama, do doente e de profissionais.

Sendo a implementação de um sistema de rastreabilidade têxtil uma mais valia para a gestão da roupa tradicional – de cama, do doente e fardamentos dos profissionais -, não posso deixar de acrescentar outras sinergias que este sistema pode induzir. De facto, e ainda que ao nível da proteção individual dos profissionais de saúde os hospitais ainda estejam formatados para a aquisição de material de uso único, abre-se claramente uma janela de oportunidade para a aquisição de equipamentos de proteção individual reutilizáveis, uma vez que será possível a monitorização inequívoca das utilizações. Este facto, associado ao conceito já referido do custo/utilização, dotará os decisores do custo das várias opções do mercado – o reutilizável e o descartável. Importa realçar ainda que sendo o descartável ambientalmente menos amigo, ainda que indiretamente, o sistema de rastreabilidade têxtil pode induzir decisões ambientalmente mais sustentáveis.

À data que escrevo estas linhas, o sistema de rastreabilidade têxtil contratado ainda não está em execução, faltando algumas semanas para o início efetivo da prestação de serviços a ele associado. Nesta fase não posso deixar de agradecer e até enaltecer o esforço realizado pelo consórcio SUCH/SNL/Fujitsu para que o previsto na contratação seja cumprido na integra, sabendo até que o consórcio já foi para além do exigido, por certo pela vontade que todos têm em que o projeto seja, de facto, uma mudança no paradigma na gestão da roupa hospitalar. Ficam, desde já, os hospitais associados do SUCH convidados para uma visita ao CHUSJ para observarem, in loco, a operação da gestão de roupa hospitalar nesta nova dimensão.

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